
Mendigo passa em concurso do Banco do Brasil
Há um ano, Ubirajara foi aprovado no concurso do Banco do Brasil. Ficou na 136ª colocação no Recife. Eram mais de 19 mil candidatos. Na última semana, finalmente, foi convocado para assumir o cargo. Porém, Ubirajara sequer tinha um documento. Nem a certidão de nascimento. Este homem praticamente não existia para a sociedade. Ele mesmo se sentia “invisível”, talvez até “irreal”. Isso explica porque durante a entrevista para esta reportagem, Ubiarajara perguntou várias vezes que impressão estava causando. “O que será que as pessoas vão pensar de mim?”, questinava, com a insegurança de quem está se sentindo real pela primeira vez na vida.
Há 12 anos, Ubirajara da Silva mora pelas ruas do Recife.
“Minha história é inacreditável”
A família
“Quem diria que aquele retardado seria funcionário do Banco do Brasil?”, pergunta Ubirajara, em tom de orgulho. Realmente, ninguém jamais diria que um jovem que viveu 12 anos na rua conseguisse ser aprovado em um concurso público tão disputado. Concursos que se tornaram uma espécie de projeto de futuro para parte significativa da sociedade. ra uma resposta para alguns dos seus familiares. Pessoas que sumiram da sua vida desde o dia em que ele resolveu sair de casa. “Essa é a parte da minha história que eu queria esquecer”.
Filho de uma garçonete com um PM exonerado, foi deixado de lado pelos dois.
Ubirajara relata constantes agressões físicas e psicológicas que sofria na casa da avó. De lá veio o termo “retardado”, que ele não esquece.
Em mais de uma década de rua, Ubirajara se acostumou a ser chamado de “preguiçoso” e de “teimoso”. “Minha teimosia é que fez com que eu não desistisse dos meus sonhos. Por mais que todo mundo me criticasse, eu continuei fazendo aquilo que eu acreditava”, resume.
No ponto de táxi do Mercado da Madalena, onde Ubirajara “morou” por um bom tempo, os taxistas o definem como um “rapaz honesto, que vivia estudando, não gostava de trabalhar e tinha um jeito de abestalhado”. Os dias de Ubirajara se resumiam a estudar. Às vezes, nas praças. Às vezes, em bibliotecas públicas. “Não tinha todos os livros, aí ia para a biblioteca, fazia rascunhos, copiava tudo e levava comigo esses papéis para todos os cantos”, conta. Ainda leva, na verdade. A tal pasta dele é repleta de anotações. Todos os tipos. Desde a sua mínima contabilidade (vive com algo entre R$ 2 R$ 5 por dia) até um projeto completo para abrir um negócio próprio.
A prova do concurso para escriturário do Banco do Brasil tinha 150 questões. Ubirajara acertou 116.
Minha vida é como a música de Cazuza: Dias sim, dias não… Vou sobrevivendo sem um arranhão. Da caridade de quem me detesta